Cai-n'águas na "rua de cima" - Sidney de Almeida, 24 de janeiro de 2019 |
Márcio Almeida
A cultura se faz autêntica em sua identidade quando agrega novos valores ao repertório de sua representação. Esses valores constituem uma área de diferença em meio a conceitos como hibridismo, ambivalência, estereótipo, terceiro espaço e negociação. Através desses valores pode-se estabelecer uma metalinguagem crítica, o local da cultura (segundo Homi Bhabha), os entre-lugares que não são nem um novo horizonte nem um abandono do passado, mas a fissura que possibilita a existência para a elaboração de estratégias de subjetivação que dão início a novos signos de identidade.
Nesse contexto, o papel do intelectual, como intérprete da sociedade, é um espaço de reflexão política, de engajamento erudito no lugar de tensão que é a cultura ante confrontos e enfrentamentos. Basta citar, no caso, o discurso que emana da chamada “retórica da perda” em relação à preservação do patrimônio histórico-artístico. É com o conjunto de valores que uma comunidade cultural pode propor uma interculturalidade crítica e portanto fazer diferença. Essa interculturalidade por sua vez permite uma resistência cultural - no sentido de sobrevivência com a história e as artes, além do diálogo com as ciências. Na história porque “ao reencenar o passado, esse introduz outras temporalidades culturais incomensuráveis na invenção da tradição” (Homi Bhabha). Donde o patrimônio, afirma Dinari Novais Jr., ser um campo de permanente tensão e conflito.
Por um lado e em conjunto, de modo coeso e vivificante os valores de uma dada comunidade participam da “retórica da perda”: a prática de patrimonizar objetos antes que desapareçam e as gerações futuras sejam capazes de acessá-las, conforme denomina José Reginaldo. O valor patrimonial constrói o valor da pátria e ou da comunidade, do qual a arquitetura é símbolo essencial da identidade nacional ou regional.
Por outro lado, há a plêiade que compõe a identidade de uma comunidade ou nação, e Oliveira arregimenta hoje uma profusão de artistas de alto nível de criatividade que diferencia a cultura local. Nas artes plásticas destacam-se Willian Júnio, que já expõe em galerias de vários países da Europa, e é capista; Sérgio Carvalho e Glaucia Silveira, talvez os mais talentosos; Washington; Pedro Sampaio, Tadeu Resende; José Eugênio; Rômulo Pinheiro (que se destaca também como intérprete musical), pintores; Maria Clara Costa (ceramista); Galdino e Sidney Almeida, fotógrafos; Leãozinho (artífice); Guto; as artesãs que expõem na Praça Xv; Moreno, primoroso artesão em metais e outros materiais; na literatura, Kener Marden, autor do romance «Memorial de Minas», com história passada em Oliveira; Ana Paula Rodrigues, autora de «Pétala no Asfalto», entre outros, Maria Íris Lo-Buono; Maria Célia R. Nicácio, autora do sublime «Porta de Emergência»; Camila Nicácio, com seu «Curtas metragens»; Marcella Dias; Márcio Almeida Jr., Marlon Araújo;o múltiplo Márcio Gato; Demóstenes, Olavo, Raquel, Alcéa e Túlio Romano; os arquitetos Heraldo Laranjo, Allyson Costa e Victor França; Amanda Vargas, Maria Ruth Laranjo, atrizes; Ronaldo Passos de Oliveira, Paulo Thielmann e João Bosco Ribeiro, diretores de teatro; Roberta Guglielmelli, contadora de histórias; a bailarina Virna Ciatti; na Música destacam-se Coral Vozes Em Canto, além de outras dez corporações, Lívio Pereira, cantor lírico; Ronaldo Rodrigues, made in London; Waltinho Almeida; André Luís e Tony José, sertanejos; as fanfarras, baterias e os blocos, como o Pelo Amooor de Deus; os sineiros Marlon Araújo, Ronaldo e Marco Antonio Carvalho Ferreira: as bandas Corcel 84, Os 4 Errantes, Sem Bandeiras, Felipe Vasconcelos, D´Retalhos; Rafael Medeiros, Desirée Viana, Dudu Nicácio; Saulo Sabino; Titane; no teatro tem-se os grupos Palcomédia e Abertura. Além dos quase mil congadeiros, cujo evento é reconhecidamente dos melhores de Minas; dos cai-n´águas, com sua tradição centenária; do multiartista Thonny Barcellos, com atuação em diversas áreas; e de Nem Campos, que assume cada vez mais um compromisso com a cultura de Oliveira a partir da «retórica da perda.»
Estes valores enobrecem Oliveira e tornam o município referência cultural sob a égide maior de Carlos Chagas. Estes valores cumprem sua função artística e cultural. Cabe ao Poder Público e empresários apoiar o elenco em suas manifestações engrandecedoras. «É com cultura viva que se desperta consciências, planta-se ideias, cria-se novas utopias. pavimenta-se novas estradas de sonhos, constroem-se novos andaimes do empreendedorismo humano e do construtivismo social», afirmam Celma Vargas e Vanessa Borges no livro «História Contemporânea de Oliveira.»
Márcio Almeida
Publicado no jornal Gazeta de Minas em 26 de maio de 2019, página 2.