O ferro e o pássaro

Concurso promovido pelo Estado de Minas revela o bucolismo de dois distritos e demonstra que Minas Gerais é um celeiro de belos cenários que, às vezes, os próprios mineiros desconhecem

Bárbara Fonseca

Desfile de carros de bois em Morro do Ferro

Em sua terceira seletiva, o concurso fotográfico Paisagens Mineiras, iniciativa do Estado de Minas, com patrocínio da Petrobras, traz cenas captadas em lugares perfeitos para quem busca o sossego. De um lado, está Morro do Ferro, distrito de Oliveira, com cerca de três mil de habitantes. De outro, Ipoema (que significa ave que canta),  distrito de Itabira, com seus quatro mil moradores. Distantes 235 quilômetros um do outro, os destinos têm em comum os atributos para desacelerar o corpo e a mente de qualquer um. 

A 32 quilômetros de Oliveira, Morro do Ferro tem suas origens no século 17. Por lá passavam os bandeirantes que cortavam o estado à procura das cobiçadas riquezas minerais. O nome do local é uma referência a sua abundância em minério de ferro, recurso que, há dois anos, vem sendo explorado por uma mineradora. Até há pouco tempo, as ruas e o chão da praça eram feitos de pedras de minério, que foram cobertas por asfalto e cimento. Vale dizer que a intervenção foi polêmica e desagradou a muita gente, como o engajado morador Ildeano Sebastião Silva, que acredita que a obra fez com que “o distrito perdesse o seu ‘RG’.”

Sentar-se à praça, principalmente no fim do dia, é conhecer as características que fazem de Morro do Ferro um típico lugarejo do interior. Crianças brincam livremente, quase não se ouve barulho de carros e moradores se cumprimentam com cordialidade. Dizem até que em Morro do Ferro vive-se mais de cem anos. A tranquilidade local só é abalada em junho, quando o distrito é invadido por centenas de visitantes. É que no dia 24 comemora-se o dia do padroeiro São João Batista, com direito a uma grande festa que começa no dia anterior. 
Imagem captada durante a Festa de São João Batista.
O evento é o destaque do clique de Sidney de Almeida, fotógrafo de Oliveira que obteve quase 60% dos votos na terceira seletiva do concurso. Na imagem estão enquadrados diversos ícones da comemoração. Chama a atenção, por exemplo, brilho do espetáculo pirotécnico, um dos momentos mais aguardados da festa, que ilumina a Igreja de São João Batista. O templo religioso, a propósito, revela um aspecto curioso em sua arquitetura. Há dois anos, um padre, intrigado com os pregos que não paravam nas paredes da paróquia, começou a raspar o reboco. A investigação culminou na descoberta de paredes feitas de pedras encaixadas, agora expostas, que muitos acreditam ser de meados do século 19. 

BANDA Outro atrativo é a Lira Batistana, corporação musical que comemora 121 anos em 2013. A banda foi criada por causa da comemoração e atualmente  se apresenta também em datas como o carnaval e a semana santa. No dia 23 de junho, véspera do dia do padroeiro, a lira é acompanhada por duas cantoras para interpretar composições em latim datadas do século 19. Completa a festa a fogueira montada em frente à igreja, que no último ano chegou a 15 metros. 

Para ter uma boa vista de Morro do Ferro, a melhor opção é subir no alto do Morro da Capelinha. De lá é possível ver outra peculiaridade do distrito, que são as voçorocas. Para explicar o fenômeno natural das enormes erosões que cercam o lugar, uma antiga lenda vem sendo contada por gerações. Dizem que no século 19, um vigário de Oliveira combinou com fazendeiros de Morro do Ferro que celebraria a Missa do Galo no distrito. Contudo, um temporal caiu na véspera e uma enchente impediu que o religioso chegasse a seu destino. 

Como resposta à falha do vigário, um dos fazendeiros mandou dar uma surra no pobre coitado, que, para não deixar barato, rogou uma grande praga no lugar. Em alto e bom som, disse que o distrito jamais conseguiria crescer. No outro dia surgiram as voçorocas. Pelo menos é o que contam. Para saber outras lendas e curiosidades não só do Morro do Ferro, mas também de Oliveira, o visitante pode percorrer o patrimônio arquitetônico da cidade, concentrado nos arredores da Praça 15 de Novembro. Destaque para a Matriz de Nossa Senhora de Oliveira (erguida entre 1754 e 1758) e a Casa da Cultura Carlos Chagas, montada em casarão de 1884, cujo nome reverencia o ilustre cientista filho da cidade. 
Vista de Morro do Ferro
Publicado no caderno de Turismo do jornal Estado de Minas em 26 de fevereiro de 2013.

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